As Cariocas (1967) - Sérgio Porto
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  • Foto do escritorRanulfo Pedreiro

As Cariocas (1967) - Sérgio Porto


Sérgio Porto já era um jornalista reconhecido nacionalmente por assinar suas crônicas como Stanislaw Ponte Preta. Por muito tempo, o pseudônimo foi mais famoso do que o próprio autor.


Aos poucos, Sérgio Porto foi embarcando na literatura mais longa. E enfrentou alguns dilemas. Queria a leveza e o cinismo de Stanislaw, mas com argumentos mais costurados e complexos, pesados até, talvez uma ponderação mais próxima dele mesmo do que do personagem que encarnava.


Assim, foi rascunhando o que se tornaria o livro As Cariocas - a versão que eu tenho é de 1975, lançada pela Ed. Civilização Brasileira -, uma coletânea de contos que, pela ligeireza, acabaram enquadrados como novelas. Enquanto Stanislaw chutava o balde, satirizando descaradamente a sociedade carioca, Sérgio Porto era mais sutil, atentando para as incoerências morais da classe média do Rio de Janeiro.


Mas o Sérgio Porto novelista deve muito a Stanislaw Ponte Preta. Ao ponto de parecer, o próprio autor, um personagem de seu heterônimo. Essa inversão de papéis explica a tranquilidade com que uma jovem lida com seus diferentes namorados e amantes em A Noiva do Catete, mas termina chorando com um abraço solitário no travesseiro - um desfecho impensável para Stanislaw.


Pois se o humor cínico, e por vezes debochado, de Stanislaw dá as caras, é Sérgio Porto quem o leva aos patamares críticos da infelicidade humana, do desassossego, do deslocamento diante do mundo, da tragédia.


Sérgio Porto especula as mulheres cariocas com certa dose de amargor, submetendo suas protagonistas às linguarudas de plantão, aos machistas indisfarçáveis, aos salafrários e canalhas movidos por sexo e dinheiro.


O despojamento da linguagem falada nas ruas mantém a atualidade desses textos como retratos de época. E nos mostram hoje como o humor fino e sarcástico faz falta, evaporado pelo engajamento a que todo o escritor parece obrigado a se submeter, indiferente de seu espectro ideológico. Um mundo tão cheio de certezas não tem mais espaço para a arte sutil da ironia.

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